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Fotografias e Fractais


Pode a imagem de um fractal ser considerada também como uma fotografia? Esta pergunta tem uma boa razão para ser feita. Porque uma fotografia tanto quanto um fractal mostram uma imagem que não foi criada ou inventada – ao contrário, as fotografias tanto quanto os fractais são o resultado de uma descoberta. Isto porque tanto o fotografo vai selecionar uma determinada parcela da realidade e registrar a sua existência, quanto o artista fractal irá produzir a visualização de determinados objetos matemáticos que ele teve que procurar entre uma infinidade, até encontrar o que lhe interessa mostrar.

Voltando ao principio da captura das imagens fotograficamente, vamos relembrar uma frase de Daguerre: “O Daguerrótipo não é uma ferramenta para copiar a Natureza, mas um processo químico e físico que auxilia a Natureza a produzir imagens por si mesma.” Vemos que Daguerre considerava as câmeras de fotografia como um método para auxiliar a Natureza a preservar e descontextualizar sua aparência, isto é, seria o mesmo que permitir a Natureza se apresentar por si mesma, oferecendo-se à contemplação dos homens. O conceito de imagem fotográfica de Daguerre atribuía à Natureza mais do que à Arte, o trabalho do fotógrafo. Ao fotógrafo, portanto, caberia descobrir uma parcela da Natureza e registrar a sua presença. O trabalho do fotógrafo, portanto, não era considerado como “autoral”. Seu registro permanecia no limbo das coisas que já existiam “sem dono”, tanto quanto todos os seres da Natureza. Não havia como reivindicar, assim, a autoria de uma imagem fotográfica.

Essencialmente uma fotografia é o resultado da ação da luz sobre um meio fotossensível. Ou seja, a captura fotográfica de uma imagem latente aplica-se igualmente às câmeras clássicas tanto quanto às digitais. Do meu ponto de vista, as imagens científicas também são fotografias, embora possa parecer exagerado atribuir tal classificação às imagens mal definidas de um Raio-X ou as imagens obtidas com ultra-som. Mas não são fotografias as imagens capturadas com um microscópio ou as imagens obtidas pela sonda espacial em Marte?

Para mim, portanto, são igualmente fotografias as imagens 3D virtuais. Porque penso que a sua construção não deva ser confundida com a sua visualização. Uma vez obtida, uma imagem 3D “existe” da forma que é vista. Os fractais entram nessa categoria, pois são visualizações de objetos matemáticos como dissemos – e principalmente porque sua visualização não se dá no território da pintura ou do desenho. São “imagens” no amplo sentido desta palavra que a fotografia vulgarizou.

Por outro lado entendo que os softwares para produção de fractais são como microscópios digitais. Assim que um determinado objeto fractal aparecer na tela do computador, o jogo consiste em calcular os detalhes cada vez menores de sua construção e traze-los à tona para serem visualizados. Tais imagens, tanto quanto uma fotografia têm o seu descobridor, mas não têm um criador real. Apenas quando os programas fractais mais sofisticados permitem incluir fórmulas matemáticas ou os algoritmos do usuário, eles se transformam em programas “artísticos”.

Da mesma maneira na fotografia, quando uma imagem original é “tratada”, misturando-a, por exemplo, com outras imagens segundo as técnicas da colagem , não há porque não dissolver a diferença entre foto e pintura, por exemplo. Mas o resultado sempre vai remanescer no reino da fotografia. Esta é uma tradição antiga, lembrando-nos dos fotógrafos “pictorialistas” dos 1900s. A maioria dos fotógrafos do princípio do século XX foram conhecidos como pictorialistas, ou seja, estavam interessados na expressão artística “criativa”. O estilo teve seus defensores em círculos profissionais e amadores, mas a técnica era controversa, e os fotógrafos discordaram sobre que qualidades definiram uma fotografia boa e se a fotografia deveria ser considerada uma arte. O pictorialismo era “estético” e assim diferente da fotografia documental ou realista. O talento de um fotógrafo combinava-se com a compreensão de um artista plástico para produzir fotografias similares às pinturas. Assim, a agudeza e a claridade inerentes à fotografia foram evitadas deliberadamente. As imagens eram ligeiramente fora de foco, suavizando as linhas “duras” da realidade e oferecendo uma qualidade “tranqüila” nas imagens.


Depois que o computador digital apareceu em cena se pode fazer com a arte formal o que a câmera fez com o ideal da mimesis ao evitar a distorção que a expressão humana introduziria. As primeiras colaborações entre artistas e computadores foram bem modestas. Os computadores não obstante foram requeridos para executar tarefas onde os procedimentos tornam-se complexos (e tediosos) para seres humanos. Recentemente algoritmos mais complexos foram desenvolvidos, como os fractais de Mandelbrot. Vale a pena mencionar o trabalho de Harold Cohen, que usa algoritmos do computador para simular as imperfeições “naturais” de mão humana. Para seres humanos isto é provavelmente interessante, mas do ponto da vista do computador é um tanto “sádico”. O que os algoritmos têm em comum, é que produzem dentro de um estilo definido - exatamente como os humanos. Embora os algoritmos ainda não possam produzir a riqueza e a complexidade das pinturas de Mondrian, Kandinsky ou Malevitch, muitos trabalhos em fractais demonstram que a tecnologia tem um potencial imenso a ser explorado.


O que pretendo dizer para finalizar estas idéias é que a noção de realidade e as imagens que correspondem a esta idealização aproximam cada vez mais técnicas e mídias tão diversas quanto fotografias e fractais. Esta “colaboração” torna-se cada vez mais exigente, pois o mundo virtual (o das imagens) deixa de ser um sucedâneo da realidade para propor cada vez mais a noção de que imagens “naturais” e imagens 3D encontradas no computador podem ser participantes de uma mesma “disposição” isto é, o mundo virtual não é uma mera cópia da realidade, mas é um mundo complementar que co-existe com a realidade. O mundo virtual dos objetos matematicamente construídos pode oferecer uma noção da realidade similar à noção dos mitos inseridos em imagens fotográficas.

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