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Showing posts from November, 2006

A Vida Breve das Espirais

Existem algumas flores que apenas florescidas, começam a se extingüir na brevidade de algumas horas. Para mim acontece a mesma coisa com as espirais. Apenas nascidas e observadas por um instante, imediatamente começam a perder a magia do seu mistério, tal a conscisão de seu minúsculo significado e como aquelas, que murcham, elas rapidamente deixam de me interessar, extinta abruptamente toda vida que as animava. Mesmo as mais intrincadas espirais, cujo engenhoso swirl sugere o fruto de uma minuciosa paciência capaz de arquitetar a complexidade gráfica da sua trama, mal resistem a um segundo olhar. Banalizam-se, como estas garotas cujos adornos (e perfumes) superam, por demasia, a simples beleza de sua presença. Nada há de mais efêmero do que a visão de uma espiral. Nisso encontro um sentido trágico, a razão mesma que desconhece tal fatídica sentença, ao mostrar-nos, quase descuidadamente, tanto desejo de beleza, que entretanto logo se encerra, como se o destino de sua existência fosse

Eppur si muove

A lenda atribui ao astrônomo italiano Galileu Galilei a frase eppur si muove , quando levado ao Tribunal da Santa Inquisição. Contudo se move , murmurou Galileu diante dos inquisidores, forçado a admitir como então era a norma dominante, que a Terra estava imóvel e, mais ainda, era o próprio centro do Universo. Quem quer que desafiasse tal inconsistência seria condenado ao patíbulo. Galileu, obrigado a negar a sua descoberta, pagou com a liberdade e foi condenado a permanecer preso em casa até o dia de sua morte, nove anos depois do julgamento, em 1642. Realizei uma série de trabalhos em 2004 representando desmoronamentos e movimentos tectônicos. Embora sem as dúvidas levantadas pelo método científico de Galileu, a sua lendária frase me serviu de motivo para uma investigação gráfica da tremenda pressão das forças geológicas de nosso Planeta.

Algorítmo e Realidade

A imagem produzida através de um processo de cálculos (algorítmo) não representa o mundo real, mas ela é o simulacro da realidade. O mundo primeiro é fragmentado (reduzido a uma fórmula) e depois, fragmento após fragmento, volta a ser reconstruído de modo que a imagem é uma visualização que não mantém mais nenhuma relação direta com a realidade. A realidade que o algorítmo oferece à visualização é uma realidade sintetizada, paralizada e artificial, produzida dentro da "nuvem eletrônica" que pulsa no interior dos circuitos do meu computador. É uma realidade cuja única realidade é a de ser virtual. Portanto, o que vamos produzir é uma imagem que não tem mais relação alguma com o Real e com a Representação

Robert Crumb

Pra mim Robert Crumb é uma espécie de Goya da civilização urbana moderna. Creio que os desenhos do americano mostram a dissolução dos instintos básicos do homem moderno, como os Caprichos do pintor espanhol mostraram a bestialidade da guerra, a estupidez das crendices, a vaidade, a mentira, tudo o que a vida contém de desagradável: Goya era moralista e perdeu o encanto pelo homem. Crumb é cínico, sarcástico e sem piedade. Crumb pegou o que de pior havia na vida americana como os quadrinhos de horror, a pornografia dos "catecismos" sexuais largamente difundidos numa sociedade reprimida e misturou tudo isso e muito mais que há de nojento, de feio, irrascível e cruel na vida americana, com a angústia sufocante de Henry Miller vivendo o "pesadelo de ar-condicionado". Enquanto desenhava ia mudando a maneira de fazer HQ. Mas eu não entendo nada de histórias em quadrinhos. O que me interessa é o desenho, é o traço, é a construção dos contornos, é a expressão da linha...

A Morte da Floresta Tropical

Tenho uma especial predileção por este trabalho, por ter sido um dos primeiros exemplos (2004) em que obtive um resultado satisfatório na execução de uma idéia. Não se tratava da simples realização de um fractal ao qual eu iria apor posteriormente um título mais ou menos sugerido pela imagem. No caso, eu desejava representar as etapas da destruição da floresta tropical, porém não de uma forma "propagandística", ou pretendendo um engajamento da forma para submetê-la aos ditames de uma posição social ou política. Ao optar pelo formato do tríptico, procurei demonstrar uma certa ironia. O tríptico é uma forma narrativa visual muito explorada nos altares das catedrais. O detalhamento da imagem induz o espectador a "entrar" na narrativa e, portanto, identificamos o tríptico com um forte conteúdo de moral e de exaltação. Ao utilizar este elemento no meu trabalho destaco que, ao contrário de induzir à "salvação" o meu tríptico demonstra a "destruição". O

Fractais e Surrealismo

Chamei esta imagem de "Exercícios da Memória" e a criei estimulado pela composição aleatória dos seus elementos gráficos. O que poderia ser entendido por "surrealismo". Não cheguei a tanto , pois em sua elaboração não mergulhei nos intricados caminhos da auto-descoberta ou de uma suposta dissecação da psiquê. Porém não posso deixar de observar que a composição tem alguns elementos formais que levam-na a uma sintonia com certas imagens surrealistas tais como as paisagens infinitas, a natureza "flutuante" de alguns elementos e, principalmente, a perspectiva "vertiginosa", que poderia elevar a imagem a um certo nivel onírico em sua significação. Abaixo algumas citações extraídas do 1º Manifesto do Surrealismo, publicado por André Breton em 1924. “A mania incurável de reduzir o desconhecido ao conhecido, ao classificável, só serve para entorpecer cérebros.” “Hoje em dia, os métodos da Lógica só servem para resolver problemas secundários”. “A extrema

A Sereia da Guanabara

Estes acontecimentos ficaram inscritos na paisagem, pois se o mar não rodeasse toda a cidade nada do que vou contar teria acontecido. Na mesma hora em que Benjamim montou na bicicleta, onde prendeu um enxadão no cano sob o selim e pedalou pela Avenida Brasil desde Ramos até o rio Irajá, para os lados do Mercado São Sebastião, onde passaria o dia cavando uma valeta no lamaçal, no outro lado do mesmo mar que abraça esta cidade, em Copacabana, um assalto a um hotel da Avenida Atlântica estava começando. Ainda era bem cedo. O paredão de edifícios diante do oceano mal se tingia da pátina rosada da aurora, que se retraía como se o novo dia não a convidasse para o nascer do sol. O Atlântico também dobrava as vagas preguiçosamente, para desafogá-las com o calmo rumor de uma despedida na areia. Os madrugadores encetavam lépidos a caminhada diária, no encalço da descarga de endorfina, que em algum momento da marcha brotaria como um manancial delicioso e restaurador. Nestes momentos,

Mergulho Noturno

Uma vez por ano, durante o verão, uma corrente de água gelada vinda das profundidades abissais chega às praias do Rio de Janeiro. A água gelada é limpíssima e a transparência permite ver o as rochas do Arpoador até o fundo. O local ganhou esta denominação na era da caça às baleias, quando os cetáceos eram atingidos com o arpão arremessado do rochedo no final da praia de Ipanema. A pedra avança para o mar propiciando ainda hoje um local previlegiado para os pescadores, não mais arpoeiros, mas tão somente empunhando a vara de nylon ou de bambú, girando o molinete e tirando um cherelete do mar, pois as baleias há muito deixaram de freqüentar tão perigosas paragens. Pois bem, quando a corrente gelada chega, Ipanema recebe a água fresca e límpida que transforma o mar numa vitrine deslumbrante para o mergulhador noturno. Isso mesmo, prezado visitante do blog, a luz das lanternas propicia uma qualidade superior para a observação da flora e da fauna do oceano. Com a água límpida as lanternas

Finisterra

Uma das mais belas quimeras medievais é Finisterra. A procura de Finisterra foi tão intensa quanto a procura do Sacrado Graal ou a procura da Pedra Filosofal ou da Fonte da Eterna Juventude. Ao contrário, porém, do Cálice Sagrado ou da Fonte da Juventude, Finisterra estava ao alcance dos corações doloridos, dos doentes sem remédio, dos pecadores angustiados e de toda sorte de mente ou alma conturbada disposta a trilhar as lonjuras da terra ao seu encontro e chegar ali - ali onde a Europa daquela época pensava estar o Fim do Mundo. Finisterra era o ponto em que o homem da Idade Média defrontava-se com o mistério do seu destino. Aquele era o último limite que Deus havia dado ao homem, seu ponto central, de onde ele, ser antropocêntrico, constatava que seguir além era impossível. Aquele lugar era o apogeu e o final da sua presença na Terra. A prefiguração do destino de toda Humanidade. Já pensou uma coisa dessas? Aqueles eram os tempos em que o homem media o mundo pelo seu ínfimo tamanho.

Criando Monstros com Fractais

Se você pensa que fractal é um meio que gera somente imagens de rara beleza como espirais extraordináriamente complexas ou intrincadas perspectivas que parecem "tragar" o espectador para o interior do swirl , então você ainda não viu nada. Eu penso que fractal é uma ferramenta de desenho, tanto quanto o lápis, o carvão, o pastel, o crayon... Sendo assim, estamos aptos a realizar qualquer tipo de imagem não representacional, quero dizer, não somos capazes de criar representações realistas embora possamos chegar bem perto do que classificamos como "realidade". Deixe-me explicar: desde que o desenho é uma arte autônoma e sendo o fractal uma técnica para desenhar, as imagens que produzimos em fractal possuem a mesma autonomia estética que caracteriza qualquer outra forma de representação. Fractais não estão subjugados pela realidade. Eles somam-se à realidade tangível dos nossos sentidos, desvendeando outras possibilidades formais para nossas percepções e para o nosso